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26.02.2015 11:18

Dicas do Professor Germano - Suicidar-se
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Suicidar-se ou suicidar
 

O que se observa, no mais das vezes, é que nem sempre os usuários da língua se sentem confortáveis no uso do verbo suicidar-se. De pronto, partilhe desta convicção: este verbo é sempre – sempre mesmo – pronominal. Mais que isso: pronominal essencial, não podendo descartar o pronome se.

 

Suicidar-se é verbo que se comporta à semelhança de arrepender-se. Não dizemos que o assaltante arrependeu de seu crime. Para andar de mãos dadas com o que é bem nosso, diga sem receio: o assaltante se arrependeu de seu crime.

 
Portanto, diga e escreva sem hesitar: eles se suicidaram, o réu se suicidou.
 

Fôssemos levar em conta tão apenas a etimologia – que se preocupa com a origem e a evolução da palavra –, a presença do pronome se, no caso específico de suicidar-se, configuraria redundância pura. Por quê? Este verbo é formado do sui inicial, que em latim traz a ideia de si próprio. A ele se amarra o radical cid, derivado do verbo latino caedere, que significa matar.

 

O elemento cida – aquele que mata – se presta para a formação de muitas palavras nossas, correspondendo à vítima do ato de matar. Homicida é o que mata o homem.

 

No direito, uxoricida denota que a vítima – o ser que sofre a ação – é a mulher. O uxoricida é, portanto, o marido que mata a própria mulher. Seu oposto seria mariticida, mulher que mata o marido. Xô, satanás!

 

 

Literalmente, suicidar-se traduz este sentido: se matar-se. No caso, a lógica gramatical aí não impera. O professor Cegalla, em seu Dicionário de Dificuldades, é categórico: A língua nem sempre se submete ao jugo da lógica.

 

No fluir dos tempos, ficou de todo esquecida a etimologia deste verbo, de tal forma que – sem medo de cometer nenhum desatino – até se pode afirmar que suicidar, dispensando-lhe o pronome, não é português.

 

Com esse esquecimento etimológico, perdeu-se a consciência de que o pronome se já fazia parte da composição do verbo. Aliás, isso não é fato insulado na história da língua. Há um balaio de palavras nas quais também nem percebemos que o mesmo fenômeno se dá.

 

Vejamos o caso de concordar com. A preposição com volta a ser usada, caracterizando uma redundância consagrada. Isso também ocorre com interpor-se entre, coincidir com, compartilhar com, antídoto contra. O uso avaliza: é cheque ao portador.

 

Se você ainda não se sente suficientemente convencido de que suicidar-se, acorrentado sempre ao pronome, é fato incontestável na língua, procure abeirar-se dos dicionários. A lição que daí se colhe é tão só esta: o verbo não dispensa a bengala do se. Aurélio registra este exemplo: Quando há anos morreu a bailarina russa..., lembro-me eu de que se suicidou um entusiasta da arte rítmica.

 

Vale anotar ainda que, figuradamente, suicidar-se significa arruinar-se, desgraçar-se. Fiquemos com o dicionarista Sacconi: Mudar de partido a esta altura é suicidar-se politicamente.

 

Disso tudo, é possível concluir: o verbo suicidar-se já está petrificado, constitui uma redundância consagrada, devendo ser usado sempre com o pronome. Na área jurídica, construamos: Por serem robustas as provas da acusação, o réu se suicidou na prisão.

 

Quanto a suicidar – desacompanhado do pronome se, portanto –, aceite meu conselho: coloque-o numa gaveta, tranque-a e jogue a chave fora.

 
Basta!
 
Professor Germano Aleixo Filho,
Assessor da Presidência do TJMT.