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26.10.2015 09:58

Dicas do Professor Germano - brasileiras e brasileiros
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 Modismo indigesto: brasileiras e brasileiros

 

Há certos modismos que nos tiram do sério. Abraçados pela imprensa, então, eles se espalham por todo canto. Um deles, não sei por que cargas-d’água, caiu nas boas graças dos políticos. Assemelha-se a tiririca, erva daninha difícil de erradicar. Refiro-me ao irritante brasileiras e brasileiros. Possibilita variantes, tão ou mais desprezíveis: as presentes e os presentes / todas e todos / muitas e muitos. Nada tão xarope. Atordoa os tímpanos, ainda que pouco sensíveis, de qualquer cristão.

Fujamos dessa mania de discriminar para atender, mais que tudo, a interesses de palanque. Há necessidade disso? Nenhuma. Na concorrência entre masculino e feminino, sigamos a inclinação natural da língua. Nem nos perguntemos por quê. Dar asas a essa forma de dizer, jamais. É simplesmente feia.

Trata-se de construção no mínimo esdrúxula. A quem atribuir a paternidade dessa arapuca? Tudo leva a crer que a pérola deve seu esplendor a um ex-presidente da República. Assim principiava seus discursos: Brasileiras e brasileiros! Quem se habilitaria a dizer que ele não teve, como pano de fundo, o interesse subliminar – entendido nas entrelinhas – de agradar o eleitorado feminino? Ah, é?!

Dizem, e não é inverdade, que o que é bom atravessa os séculos. Oxalá isso não ocorra com este monstrengo. Afinal, não desfralda qualidade nenhuma. Provindo do século que nos antecedeu, encontrou as portas escancaradas para circular também no novo milênio. Até quando, só Deus sabe. Bombardeados pelo entediante “brasileiras e brasileiros”, cabe- -nos enxotá-lo, bem assim a seus filhotes.

Sacconi, em Não erre mais!, 31. ed., assegura que essa expressão, reabilitada por Fernando Henrique, foi prestigiada por Lula. Não bastasse, foi alterada para pior. Razão tem o povo: bobeira pouca é miséria!

Aí vai a versão pra lá de “elaborada”: Esta é a hora de cada “brasileiro e brasileira” pensar menos em si mesmo e mais no país. O texto pede socorro. É revelador de um deslize na concordância verbal: pensar está por pensarem, impulsionado por seu sujeito composto. Decorrência disso, outro tropeção, agora na concordância nominal: mesmo por mesmos.

Não precisamos fazer reflexões altamente filosóficas para concluir que, no recorrer ao adjetivo pátrio brasileiro, no plural, a forma feminina por si só se dispensa. O masculino – aprendemos isso nas “carteiras” escolares de nosso primário – nos leva a induzir que a referência ao feminino está nele englobada.

Podemos perguntar a um amigo: Quantos alunos há em sua universidade? Inteligente, dono de resposta pronta, dirá: Em minha universidade há tantos alunos. Em sã consciência, não consigo imaginar que alguém, dotado de “conhecimentos iluminados”, viesse a nos responder: Em minha universidade há tantos alunos e alunas. Valha-me, São Nicolau! Convenhamos: ninguém merece.

A continuarmos nessa marcha, dia chegará em que, sem mesura nem cerimônia, diremos que 15 de outubro não é mais o dia do professor: é o dia do professor e da professora. Absurdo, não?

Mais seja dito: a seguirmos por esse caminho pontilhado de curvas, não poderíamos dizer: É necessário que todos vivam com honestidade. Nada disso. Correto seria tão só: É necessário que  todos e todas vivam com honestidade. Até onde chega o disparate! E a presidente, em rede nacional, a se gabar: Meu governo é para todos e todas. Risível.

Olhos voltados para estas duas frases: Os brasileiros são hospitaleiros. / Todos os brasileiros sofremos com a crise aqui instalada. À luz dos partidários do enervante modismo, nosso texto – com o intento de massagear o ego das mulheres – deveria ser modificado: As brasileiras e os brasileiros são hospitaleiros. / Todas as brasileiras e todos os brasileiros sofremos com a crise aqui instalada. Primariedade de dar dó. Estreiteza de inteligência.  

Em respeito a nosso interlocutor, nem de longe ousaríamos afirmar: É importante que cada professor e cada professora cumpram seu papel de educador e, por que não, de educadora. Caracterizaria evidente menosprezo à sua capacidade intelectual.

O papel da mulher se robustece a cada dia em nossa sociedade. Cargos e funções que, noutros tempos, eram quase exclusivos dos homens, hoje são igualmente partilhados por elas. Não lhes bastasse a competência, agregam dedicação, muitas vezes, de longe maior. Já não nos causa estranheza topar com uma oficiala de justiça, com uma sargenta, com uma árbitra. Os tempos são outros, e todos – dispensado aqui o entediante “todas” – temos de nos curvar diante da realidade.

Em Inculta e bela 4, o prof. Pasquale se reporta a uma faixa com esta mensagem: Defenda o IPTU progressivo. A isenção de 1,6 milhão de imóveis beneficia 9 milhões de cidadãos e (ãs). Em seguida, pondera : o “politicamente correto” às vezes causa estrago.

Saída é que continuemos a combater o caráter machista da língua sem desmerecer a mulher. Na abertura de uma fala, nada impede que, por deferência, recorramos à fórmula “Senhoras e senhores!”.  Em atenção ao cavalheirismo, é de bom-tom a anteposição do feminino. Mas reduzir as mulheres a “ãs”, como ocorreu na faixa da cidade de São Paulo, entalando-as dentro de estreitos parênteses, aí já é de mais. A lambança foi grande. Bastaria que o autor da faixa – pobre de cabeça – se limitasse a “cidadãos”. Um ano de xilindró. É o que este crime merece.

Palmilhemos a trilha que respeita a índole da língua. Na concorrência – meramente gramatical – entre o feminino e o masculino, demos passagem ao masculino plural. Amigos compreende amigas e amigos. Brasileiros – embora não seja este o pensar de certos políticos – engloba brasileiras e brasileiros.

Por que discriminar às tontas, sem necessidade alguma que o justifique? Espinafremos este infeliz modismo. “TODOS e TODAS”, nem a pedido de majestades e excelências.

Basta.

Cuiabá, MT, 22-10-2015.

Prof. Germano Aleixo Filho,
Assessor da Presidência do TJMT.