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Poder Judiciário de Mato Grosso

 
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25.05.2016 17:04

Divórcio: A vida não vem com manual de instrução
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A sala de aula com pipocas e uma mensagem de “bem-vinda, gurizada” escrita no quadro negro dava o tom de que aquele momento seria de pura diversão para os adolescentes de 7 a 18 anos que ali estavam. Embora, o clima de leveza e afeto pairasse no ar, a razão pela qual eles foram convidados para aquela oficina era delicada: o divórcio dos pais.
 
Vocês costumam beijar seus pais? Como vocês demonstram carinho por eles? Como vocês podem fazer para sentirem-se melhor? Essas foram algumas das perguntas que a psicóloga e mediadora, Roseli Saldanha, utilizou para conscientizar os adolescentes sobre a importância de trocar afeto com os pais, mesmo após a separação. O encontro, realizado na última segunda-feira (23 de maio), fez parte da Oficina de Pais e Filhos da Comarca de Cuiabá.
 
“Está sendo muito maravilhoso realizar esse trabalho. Conseguimos fazer uma verdadeira conexão amorosa. A maioria dos adolescentes acredita que só eles passam por isso, até que se abrem e veem que é comum a todos. Procuramos fazer com que eles entendam que os pais também sofrem com a situação e que com diálogo, vontade e compreensão, tudo é possível”, afirmou.
 
A manifestação de uma das adolescentes em dado momento da oficina comprovou as afirmações da psicóloga. “Às vezes ficava brava e triste com a minha mãe e com o meu pai, porque os culpava por terem se separado. Até que resolvi me colocar no lugar deles e vi que não podia obrigá-los a ficarem juntos sem que eles quisessem. Entendi também que eles sofrem que nem nós e que devemos dar apoio e carinho”, disse.
 
Roseli Saldanha explica que a Oficina de Pais e Filhos, também conhecida com Oficina de Parentalidade, é destinada às famílias que estão em processo de divórcio, com a finalidade de mostrar que a ruptura da união não deve interferir na vida dos filhos. A reunião é realizada com o auxílio de psicólogos e assistentes sociais, que dividem os participantes em dois grupos: um de pais e outro de filhos – sendo um de crianças e outro de adolescentes. Com as crianças, o assunto é tratado de forma lúdica, já com os adolescentes e adultos o tema é abordado usando exercícios, vídeos e palestras.
 
Da sala ao lado dos adolescentes ouvia-se o barulho de risadas e cantorias. “Tudo é possível se a gente for feliz e sorridente” entoavam alegremente as três instrutoras junto às 11 crianças alvoroçadas. Era a oficina das crianças de 3 a 6 anos. Em meio aos versos, as facilitadoras soltavam perguntas uma às outras e às crianças: “Posso gostar do meu papai mesmo ele tendo se casado com outra mulher? Sabia que tem gente que tem duas mamães?” E de imediato, as crianças respondiam: “Eu tenho, tia. Eu tenho!” A cada resposta as crianças ganhavam balas e bombons.
 
Mas, só foi perguntar se elas podiam ganhar presente da namorada nova do papai que o tempo fechou. Na sua inocência, um menino respondeu que não, que era errado. Já a amiguinha ao lado, disse que não ligava e que podia sim. “As tias” logo interviram, continuando a brincadeira e ensinando que sim, ganhar presentes de pessoas conhecidas não era errado.
 
Nas duas salas ao lado estavam sendo realizadas as oficinas dos pais. A atmosfera era de emoção e reflexão. Cenas de situações comuns entre pais que vivem o divórcio litigioso eram mostradas por meio de uma simulação em vídeo, como falar mal do ex-companheiro (a) na frente dos filhos, usar os filhos como mensageiros, brigar na frente das crianças, ser ou não o alienador, dificultar o contato entre o pai ou a mãe e o filho e achar que a esposa usa o valor da pensão para se beneficiar.
 
Um dos pais que assistiu à oficina foi Pedro Castro Júnior. Separado há oito meses, o professor e inspetor de colégio, de 58 anos, conta que gostou de participar da oficina. “Foi muito válido, pois é uma forma de fazer as pessoas refletirem sobre o que elas estão fazendo da vida delas. Este é o meu terceiro divórcio e dele nasceu o Pablo, de oito anos. Meu filho é um grude comigo. Vive pedindo para morar comigo. Eu queria a guarda total dele, pois discordo de algumas coisas na forma que a mãe cria ele. O pai dela bateu muito nela na infância e ela quer reproduzir isso com o menino. A gente brigava muito por causa disso”, relatou.
 
Pedro disse ainda que pode identificar vários comportamentos cometidos por ele e pela ex-mulher. “Às vezes a gente faz coisas achando que está fazendo certo e na realidade está complicando a vida. Tomara que ela absorva um pouco deste material e comece a usar. Eu também consegui refletir sobre algumas coisas. Ouvi coisas que eu precisava ouvir. Achei a oficina uma forma muito bacana de educar as pessoas”, acrescentou.
 
Os 24 casais que participaram da Oficina de Parentalidade foram selecionados por meio dos seus processos de divórcio que tramitam nas cinco varas de Família e Sucessões do Fórum de Cuiabá. Além dos 71 participantes (48 pais e 24 filhos), os magistrados também fizeram questão de acompanhar as atividades.
 
Segundo o juiz da 4ª Vara de Família e Sucessões de Cuiabá, Gilperes Fernandes da Silva, assistir às oficinas ajuda a conhecer melhor o seu conteúdo e a identificar o perfil dos casais aptos a participarem. “Eu separei os processos de divórcio conforme o grau de litigiosidade, pois alguns pais não conseguem manter a harmonia, querendo fazer valer apenas a sua vontade, sem perceber que o mais importante é o bem-estar dos filhos. Acredito que a maioria deles vai fazer uma nova análise da conduta deles em relação aos filhos. O processo acaba se formando para que a gente tenha conhecimento dos fatos, mas a solução do processo através de uma sentença não resolve o caso em si. É preciso realmente entrar no seio da família. O objetivo do judiciário é fazer com que eles aprendam a resolver seus problemas sem precisar que seja ditada uma solução”, garantiu.
 
A Oficina de Pais e Filhos foi fixada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na Recomendação nº 50/2014. Cabe ao Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (Nupemec/TJMT) estimular os magistrados a encaminharem os processos para a mediação de conflitos em demandas nas quais haja necessidade de recomposição de vínculo interpessoal ou social. A Oficina de Pais e Filhos já vem sendo realizada em várias comarcas, mas o objetivo é que a prática seja adotada como uma política pública na resolução e prevenção de conflitos familiares em todo o Estado.
 
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Mariana Vianna/ Fotos: Tony Ribeiro (F5)
Coordenadoria de Comunicação do TJMT
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