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Poder Judiciário de Mato Grosso

 
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10.06.2021 14:35

Proteção e destruição do Cerrado são temas apresentados em primeiro dia de webinário
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Primeiro palestrante do webinário “Conhecendo o Cerrado – o que podemos e devemos fazer pela proteção do bioma?”, o ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), trouxe ao debate na manhã desta quinta-feira (10 de junho) o tema ‘proteção dos cerrados’. Logo no início, o magistrado enfatizou a posição de destaque do Estado de Mato Grosso no Brasil e no mundo. “Mato Grosso se transformou num verdadeiro celeiro, a princípio com muita desconsideração pelo meio ambiente, muita insensibilidade. Mas hoje o Estado se vê como um cartão de visita do Brasil para o mundo no que tange ao agronegócio sustentável”, pontuou.
 
Segundo ele, tão importante quanto as toneladas de soja, milho, algodão e outros produtos do campo exportados, é a imagem de quem exporta. “Isso abriu os olhos do agronegócio de Mato Grosso para essa realidade externa. Não basta produzir e produzir muito. É preciso ter a capacidade de produzir ecologicamente bem. Isso significa abrir mercados, e não o fechamento de mercados para os nossos produtos”, salientou.
 
 
O ministro Herman Benjamin assinalou ainda que pouco se conhece sobre o cerrado. “Há 40 anos não se falava que essa ‘mágica no campo’ em Mato Grosso, com três safras, depende de algo que se chama regime climático. Da precisão da natureza de entregar regimes de chuvas que são quase cronometrados. Não basta apenas ter a terra, é preciso ter água e no momento adequado. São incógnitas que os fenômenos naturais possuem e que a cada dia conhecemos um pouco mais. Imagine transportar grãos de Mato Grosso para os portos e enviar para o outro lado do mundo, ainda com preços competitivos? Isso se deve sobretudo ao regime hidrológico. Não é tanto pelos solos extraordinários, mas pelo uso da tecnologia e regime hidrológico.”
 
Ainda na apresentação, o palestrante assinalou que o cerrado não possui um regime legislativo especial para si, como tem a mata atlântica. “A falta de regime legislativo próprio para o cerrado pode trazer dificuldades de implementação do bioma na legislação como um todo. Mas isso não impede a proteção do cerrado”, afirmou. Conforme o ministro, a proteção política do meio ambiente, sobretudo da flora, se faz a partir da função ecológica da propriedade. “Nós juízes devemos sempre utilizar esse princípio da função ecológica quando vamos decidir as principais questões que afetam o meio ambiente e que chegam a nossa mesa”, ressaltou.
 
Outros pontos destacados pelo ministro na apresentação foram as construções jurisprudenciais que, em se tratando do tema, se formaram antes da lei, com base na consciência coletiva comum, assim como o princípio in dubio pro natura. “Se houver dois ou mais modos de interpretar a lei, e se [o juiz] não for adotar a possibilidade mais protetória ao meio ambiente, deve-se fundamentar quais as razões pelas quais não adotou a forma que melhor tutela o meio ambiente e os processos ecológicos essenciais.”
 
Aos colegas magistrados, o ministro reiterou o entendimento do corregedor-geral da Justiça, desembargador José Zuquim Nogueira, no sentido de que os juízes não podem permanecer inertes. “Aquela imagem de justiça cega, mas ainda cega para a Constituição e as leis, é incompatível com o estado de direito que nós temos. Somos guardiões das normas constitucionais e infraconstitucionais. Somos guardiões da legalidade. Assoberbados com tantos processos, os juízes não dão às questões ambientais a importância que a Constituição e as leis exigem. Mas o Judiciário não deve ficar preso ao processo. Existe muito mais que pode fazer”, afirmou.
 
Um exemplo citado pelo palestrante é o projeto Verde Novo, desenvolvido pelo Judiciário de Mato Grosso, por meio do Juizado Volante Ambiental de Cuiabá, e que visa devolver o ‘verde’ à capital mato-grossense por meio do plantio de árvores. “Isso é além daquilo que formalmente se exige para o juiz como indivíduo. É apropriado para a magistratura, pois não vivemos num casulo. ”
 
Herman Benjamin destacou ainda a importância do Estado na proteção pública do meio ambiente. “É insubstituível. A corrupção em órgãos ambientais é algo gravíssimo e inadmissível, especialmente para o agronegócio, pois o prejuízo de imagem é incalculável. Daí que os atores do agronegócio devem ser os primeiros a exigir integridade da administração pública”, asseverou.
 
Em seguida o professor-doutor Altair Sales Barbosa apresentou a palestra A destruição do Cerrado e a Crise do Abastecimento de Águas nas Cidades. Na ocasião, ele destacou que o Cerrado tem uma história evolutiva extremamente complexa e diferente de todos os outros ambientes que o circundam. Enquanto a Amazônia surgiu por volta de 7 mil anos atrás, a caatinga há aproximadamente 20 milhões e a Mata Atlântica há quase 8 mil anos, o Cerrado existe há cerca de 65 milhões de anos, sendo o sistema biogeográfico mais antigo.
 
“Sabemos que a história recente do planeta Terra começou na era Cenozoica, quando quase toda a biosfera do planeta foi eliminada pelo impacto de um meteorito. Praticamente a vida do planeta se extinguiu e o planeta teve que se refazer a partir de 65 milhões de anos. O primeiro ambiente a surgir nessa época foi o Cerrado. Por isso é que dizemos que o cerrado é o mais antigo ambiente da história recente do planeta Terra. Isso traz algumas consequências, a primeira delas é que um ambiente que já chegou a seu apogeu evolutivo, uma vez degradado, ele não se recupera jamais em sua plenitude de biodiversidade porque o solo original que fazia com que aquela planta que suga carbono da atmosfera e deposita em seu solo, não existe mais. O solo do cerrado foi totalmente modificado.”
 
O professor ressaltou ainda que quase todas as águas do Brasil dependem das águas que nascem no cerrado, mas, por conta da urbanização do território, os aquíferos estão se deteriorando.
 
“O São Francisco e a perenização de sua própria vida dependem das águas desses dois aquíferos [Bambuí e Urucuia, que estão localizados no Cerrado], que também mandam águas para outras bacias como Amazônicas e do Parnaíba. A partir de 1970 um novo modelo de ocupação territorial tomou conta do cerrado e hoje praticamente os Cerrados não existem mais. Esses aquíferos chegaram a nível de base, isso significa que um forte período de estiagem prolongada, colocará em colapso todos os rios que estão à nossa disposição localizados no sudeste e no sul do Brasil, incluindo o Amazonas, no norte, toda a Bacia do Paraná e a sub-bacia do Paraguai”, finaliza Barbosa.
 
Lígia Saito e Keila Maressa
Coordenadoria de Comunicação do TJMT
imprensa@tjmt.jus.br