Notificação é a voz da vítima, afirma corregedora
“Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho e nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada”. Assim a desembargadora Maria Erotides Kneip começou a falar aos participantes do 1º Seminário Intersetorial de Notificação de Violência, nesta terça-feira (15 de setembro).
Este é um trecho do poema ‘No caminho, com Maiakóvski’, de Eduardo Alves da Costa, citado pela corregedora-geral da Justiça para exemplificar o que acontece com as vítimas de violência em todas as suas formas. “Elas são vítimas do medo. Nós somos a voz da vítima que se calou pelo medo. A notificação é a o reavivamento dessa voz calada, sufocada”, defendeu Maria Erotides.
A desembargadora afirmou que toda violência é uma relação de poder, na qual um se coloca em posição de superioridade em relação ao outro, além de ser cíclica e geracional. “Quem apanhou na infância vai bater na fase adulta, a menos que se interrompa esse ciclo. E a notificação é o primeiro passo para que isso aconteça”, argumentou a magistrada destacando que a notificação permite a criminalização do agressor. Acompanhado a corregedora, o juiz auxiliar e coordenador-adjunto da Coordenadoria da Infância e Juventude (CIJ), Luiz Octávio Saboia, observou que nem sempre é possível enxergar o ciclo da violência. Ele fez um comparativo histórico sobre a maioridade penal e lembrou que, no passado, crianças e adolescentes já foram responsabilizados por crimes como adultos. “Mesmo assim, voltamos a discutir hoje a redução da maioridade penal. De fato nos esquecemos do ciclo da violência. Ou rompemos com isso de vez ou daqui a 10 anos estaremos aqui novamente para debater o mesmo assunto”, declarou.
O magistrado pontuou que a notificação compulsória e a formalização da rede de proteção vão permitir mapear a violência em Mato Grosso e possibilitar o combate com mais eficiência a partir da real identificação dos casos. “A agressão de qualquer forma é inadmissível. Precisamos dar voz às vítimas, acreditar nelas, notificar, colocar no papel. Não é um trabalho fácil, atuar de modo intersetorial é difícil, mas é o correto”, frisou.
Luiz Octávio Saboia informou ainda que a denúncia é sigilosa e que a notificação é a comunicação de um fato para que a rede atue, investigue e auxilie na punição do agressor. A desembargadora Maria Erotides colocou a CGJ à disposição da rede para defender o profissional subescritor que possa vir a sofrer ameaça em razão da notificação.
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Ana Luíza Anache
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