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01.04.2015 10:46

Dicas do Professor Germano - Dom Aquino Corrêa
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Dom Francisco de Aquino Corrêa: 130 anos

 

Em 2008, tomado de orgulho, recebi da Câmara Municipal de Cuiabá uma comenda: Ordem do Mérito Legislativo Dom Francisco de Aquino Corrêa. À época, produzi um opúsculo retratando sua vida: Grandemente simples, simplesmente grande. Dele me socorro para esta coluna.

 

Na história de Mato Grosso, a figura de Dom Aquino se distingue. Num dois de abril de 1885, há 130 anos, uma chácara, à beira do então piscoso rio Cuiabá, festeja sua chegada. Último de quatro filhos, faleceu-lhe a mãe mal completara cinco aninhos.

 

Residiu na antiga Rua dos Pescadores, conhecida como Rua Nova. Mais tarde, em sua homenagem, passou a carregar-lhe o nome: Avenida Dom Aquino Corrêa.

 

Estudou no Colégio São Gonçalo. Autodidata. No fazer os Exames de Madureza, que fechavam o antigo ginásio, sua nota não surpreendeu: 10 com louvor. O Chiquinho da Rua Nova era sucesso, dele se envaidecendo o povo cuiabano.

 

Com 17 anos, bate às portas do Noviciado, no Patronato Santo Antônio, Coxipó: queria ser sacerdote. Com 19, Roma o acolhe: cinco anos na Universidade Gregoriana. Triunfa soberbamente.

 

Ordena-se em Roma, com 24 anos. Outros dois se passam: torna-se diretor do Colégio São Gonçalo. Em 1914, chega a notícia de sua elevação ao episcopado: seria o primeiro bispo salesiano brasileiro. Honra para Cuiabá. Não menos para Mato Grosso. Tinha 29 anos: o bispo mais jovem do mundo. Exerce o bispado em sua terra natal, por 41 anos.

 

Dada a crise política que reinava no Estado, seu nome é lembrado para congraçar a família mato-grossense. Com o aval da Santa Sé, torna-se governador, no alto de seus 32 anos. Tarefa quase impossível: conciliar o que irreconciliável estava.

 

Nesse período, funda a Academia Mato-Grossense de Letras. Grandes amigos que eram, o Marechal Rondon resume seu governo: Ninguém, melhor do que ele, se sairia dessa empresa.

 

Quatro anos bastaram para que nevassem seus cabelos. Busca uma diocese pequena, mas a Santa Sé o queria pastoreando não mais sua cidade mas seu Estado: é nomeado arcebispo. Assume uma arquidiocese rica de problemas, pobre de auxiliares. Só dois sacerdotes.

 

Exaurido, busca o Rio de Janeiro para merecido descanso. Nada de repouso. Convidado a abrir o Congresso Eucarístico, magnetiza o mundo católico. Seus discursos e palestras, eis o recurso de que se valia para construir a igreja de Nossa Senhora Auxiliadora e a do Bom Despacho. Satisfazia-se com ser pobre em meio a seus pobres.

 

Para obter mais recursos, comemora no Rio de Janeiro, ladeado por Rondon, o Centenário do Bispado de Cuiabá. Veio o convite para o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Seu nome desconhecia horizontes.

 

Atiçado por Dom Leme, arcebispo do Rio, lança seu nome à vitoriosa candidatura à Academia Brasileira de Letras. Inicialmente, cinco concorrentes, entre eles o jurista Pontes de Miranda. Foi eleito. Único cuiabano a ingressar na Academia. Uma alegria incontida toma conta de seu povo. Contava 42 outonos. No discurso de posse, trombeteava: Venho de longe, dos sertões de sol e de flores...

 

Mas nem tudo eram flores. Agripino Grieco, anticlerical, espingardeava o filho do longínquo Mato Grosso. Tentando destronar-lhe o prestígio – dado que a Academia agasalha 40 associados –, do pedestal de sua fúria desferiu rematada sandice: Dom Aquino é o zero dos 40. Rebate magistralmente o acadêmico mato-grossense: Que seria do quarenta sem o zero?

 

Sua arquidiocese – de dimensão amazônica –, ele a administra com dificuldades sem par. Quando não de barco, no lombo do cavalo afronta os pantanais e as matas. Sua palavra a todos iluminava.

 

Amicíssimo de Getúlio Vargas, que até o convidou fosse seu vice-presidente, em 7 de agosto de 1941 Dom Aquino recepciona, em Cuiabá,  o presidente da República na Academia Brasileira de Letras.

 

Sua saúde começa a declinar. Madrugador, acordava às três e meia. As dores, antes de minorarem, iam aumentando. Em avião da Presidência da República, é levado ao Rio de Janeiro, onde passa meses internado. Rondon o visitava semanalmente.

 

Assim como o vento curva os frágeis galhos duma roseira, sua jornada ia chegando ao fim, curvada ao peso do tempo. Disritmia cardíaca e fraqueza generalizada, suas companheiras onde estivesse.

 

Foi em 22 de março de 1956. Morre Dom Aquino. Havia nascido numa Quinta-Feira Santa. Quis a Providência que seu retorno à casa do Pai também se desse em outra Quinta-Feira Santa. Coisas do céu!

 

A notícia de seu falecimento despenca por todo o território nacional, orfanando sua terra natal e seu Estado. No ainda não inaugurado aeroporto, hoje Marechal Rondon, pousa o primeiro avião, transladando de São Paulo seus restos mortais.

 

Seu funeral, um oceano de gente o acompanha. Uma enxurrada de afeto. Ele, que fora o bispo mais novo do mundo – agora o mais antigo do Brasil –, cerrava seu ciclo.

 

Ficou-nos a vida exemplar. Seu quarto, simplicidade jamais vista: uma cama de lona, sem colchão, pequeno criado e um armário – presente do pai – onde guardava suas relíquias: os livros. Havia também uma tosca cadeira de balanço. Nem água encanada dispunha. Extremo conforto!

 

Brindou-nos com a certeza de sua estatura moral e intelectual. Escreveu, com sua vida, a mais bela página deste Estado: ainda na terra, vivia a aspirar às coisas do alto. Por ter sido homem de Deus, foi o arcebispo cuiabano muito estimado. Amado para todo o sempre.

 

 

Professor Germano Aleixo Filho,
Assessor da Presidência do TJMT.