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30.07.2015 14:06

Dicas do Professor Germano: Embora
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Conjunção “embora”: exige o subjuntivo

 Qual oração você escolheria?

a)   Embora pareça fácil, é tema de difícil compreensão.

b)  Embora parece fácil, é tema de difícil compreensão.

 

Usual é que, nas orações concessivas, empreguemos o modo subjuntivo. Corretíssima, portanto, a opção a. Os clássicos também faziam uso do indicativo, conforme alternativa b. Hoje, virou coisa de museu.

 

Não de hoje, trago comigo a convicção de que uma das causas por que nossos alunos pouco se interessam pela Língua Portuguesa se deve ao desconhecimento dos termos gramaticais. Ainda que empregada a toda hora, ignoram, por exemplo, o que se entende por conjunção concessiva, não sabem o que significa pronome relativo. E vão se perguntando: o que é mesmo substantivo?

 

O tema desta coluna – focado na palavra embora – é convite a que nos debrucemos sobre o sentido de concessiva quando falamos em conjunção concessiva. Sem receio de errar, trata-se da função mais comum que o vocábulo embora encerra.

 

No mais das vezes, não sei por que cargas-d’água, os professores de Português deixam de esmiuçar o que de fato seja concessiva. Assim, não há aluno que aprenda! Concessiva­ – não é novidade ­– se associa a concessão, sentido de ressalva, oposição. Nos bons tempos de professor, já chamava a atenção para isto: concessão significa fundamentalmente exceção à regra.

 

Esclareçamos: Embora esteja chovendo muito, irei ao estádio. A oração concessiva – iniciada pela conjunção embora – mostra que, por alguma razão especial, vamos atropelar o que foge ao corriqueiro. Normal é ir ao estádio apenas quando não chove. É como se disséssemos: este jogo eu não perco de jeito nenhum, ainda que chovam canivetes...

 

Outras sentenças em que o embora tem vez: A rosa, embora seja bela, tem espinhos. Embora comesse muito, ele não engordou. Não passa na OAB, embora estude com determinação.

Todo cuidado é pouco! Para OAB, devemos dizer ó á bê. Há os que, de boca cheia, alardeiam: passei na “ô” á bê. Parabéns pela conquista, nota zero pela pronúncia! Também SOS (esse ó esse), IOF (i ó efe). No mesmo rumo: TRE (tê erre é), IBGE (i bê gê é), DNER (dê ene é erre). Isoladamente, as vogais são soletradas com som aberto.

 

Estampadas as concessivas acima, observamos que, atualmente, nós as usamos com o verbo no subjuntivo. Eterno amor. Em tempo: a conjunção embora repele o gerúndio. Fujamos destas combinações esdrúxulas: Embora sendo paupérrimo, ele não mendiga. Embora comendo muito, não engorda. Pelo jeito, o embora prefere as labaredas do inferno a se juntar à desclassificada companhia.

 

Num livro jurídico, específico para a Língua Portuguesa, topei com esta feiura: “... questão que, embora não sendo a que se propõe para ser solucionada, influi ou pode influir na decisão”. Não nos escandalizemos. Errar, todos erramos. Afinal, ninguém é perfeito...

 

Em português, há um princípio que vigora: se o verbo da oração principal estiver no presente, necessariamente o verbo da subordinada também estará. Se no passado o verbo da principal, igualmente o verbo da subordinada estará no passado. A isso denominamos correlação temporal, também dita correspondência temporal.

 

Com a atenção que merece, ponhamos esta frase sob nossos olhos: Pedimos sua colaboração para informar se a mercadoria já está na Comarca tal. Sabemos todos: a forma verbal pedimos tanto pode ser presente do indicativo quanto pretérito perfeito. Se “pedimos” está no presente do indicativo – o contexto é que haverá de nos confirmar  –, a correspondência temporal se revela corretíssima nesta oração. Daí, também no presente o verbo da subordinada: está!

 

Se, no entanto, o verbo “pedimos” equivaler ao passado – pretérito perfeito –, outra será a correlação: Pedimos (há algum tempo) sua colaboração para informar se a mercadoria já estava na Comarca tal.

 

 Correspondência temporal é isto: presente com presente, passado com passado. Daí: eu peço que você faça, mas eu pedi que você fizesse. Deve haver harmonia entre o tempo do verbo da oração principal e o tempo do verbo da oração subordinada.

 

Voltemos ao tema desta coluna. Acertado ficou que o embora nos obriga, hoje, a empregar o subjuntivo. Bola pra frente. Sirva-nos de apoio a lição de Napoleão Mendes de Almeida, pinçada em seu Dicionário de questões vernáculas.

 

Se o verbo da principal estiver no presente, o subjuntivo da concessiva será igualmente o presente: Embora lute muito, ele nada consegue. Não obtém aprovação, embora seja aplicado. Não gosto da aula dele, embora o tenha como bom professor.

 

Se, por outro lado, o verbo da principal estiver no passado, o verbo da subordinada será o imperfeito do subjuntivo – ou até mesmo o mais-que-perfeito se a oração for anterior: Ele cuidou da mãe, embora esta não precisasse. Não gostei da apresentação, embora fosse bom ator. Igualmente: Escorregou, embora tenha sido avisado do perigo.

 

Pode acontecer, ainda, que o verbo da oração principal esteja no futuro. Neste caso, o subjuntivo da concessiva deverá ficar no presente: Ele não apreciará o show, embora seja fã daquele cantor. Embora eu não aprove sua viagem, ele irá assim mesmo.

 

Temos insistido nisto: o mais adequado é que, ao lançarmos mão de uma oração concessiva – iniciada por embora, ainda que, posto que, mesmo que, se bem que –, seu verbo deve, nos dias que correm, ficar no subjuntivo.

 

Os clássicos, contudo, recorriam também ao indicativo. Não podemos afirmar que isso caracterize desvio gramatical. Trata-se de construção que, a cada dia mais, vai resvalando no esquecimento. Nos Sermões, o Padre Vieira usa a locução ainda que, associando-a ao indicativo: O trigo do semeador, ainda que caiu quatro vezes, só de três nasceu.

 

Resumo da ópera: por esta e por outras, fiquemos com a alternativa a apresentada na abertura da matéria, conhecida por lead.  Bem mais apropriado é dizer: Embora pareça fácil, é tema de difícil compreensão.

Basta!

 

Prof. Germano Aleixo Filho,
Assessor da Presidência do TJMT.