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27.04.2017 10:12

Dicas do Professor Germano - Campus ou Câmpus?
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 Campus ou câmpus: qual o correto?
 

O parentesco entre a língua de Cícero e o português é tão umbilical, que nem precisamos pedir licença para incorporar algo que corria lá pelas bandas do Lácio. Desse nome – Latium, pronunciado “Lacium” – nos adveio o termo latino.

 

Sinal de boas-vindas, cabe-nos dar roupa nova aos latinismos, com o feitio de hoje. Bem por isso, já está mais do que na hora de vestirmos câmpus com roupagem nossa. Por que, à latina, continuarmos a escrever campus universitário, campi universitários?

 

Argumento forte para aclimatá-lo de pronto é que topamos com um embornal de palavras semelhantes que, de há muito, passeiam por aqui. É o caso de ônus: seu sentido primeiro era carga, peso, fardo. À época onus, porque inexistia acento em latim.

 

 Curioso é saber que até mesmo a criança que a mãe trazia no ventre recebia o nome de ônus. O tempo se encarregou de lhe impregnar novo sentido: encargo, coisa difícil. No Judiciário, não hesitamos: o ônus da prova cabe a quem acusa. Sim, o acusador carrega esta obrigação.

 

Do latim de nossa origem derivou este provérbio: não há bônus sem ônus. Taí: bônus é outra palavrinha nossa, desde que o mundo é mundo. Campus – se não quiser ser diferente, a ser grafada com itálico – deverá palmilhar o caminho de bônus e ônus. Com acento: câmpus.

 

Qual o plural de ônus e bônus? Acredite se quiser: a forma é uma só tanto para o singular quanto para o plural: os ônus e os bônus. Daí dizermos: Trata-se de ônus reais. / No Natal, recebi bônus extras.

 

Onde então a razão de grafarmos campi, no plural, em vez do aprazível câmpus, vestido ao nosso estilo? A resistência repousa no saber acadêmico-científico. Se a intelectualidade já acolheu lócus, por que insiste em campus, ovelha apartada do rebanho? E pensar que tive o desprazer de ouvir – de pessoa grada – campi, oxítona, à semelhança de caqui. É de doer!

 

Por que submeter os falantes a esse desconforto? Não podemos exigir que as pessoas saibam latim, embora, no jurídico, um tantinho dele seja indispensável. Num texto acadêmico, tropecei com “obterdictum. Qual nada! Acertado é obiter dictum, o que foi dito de passagem. Em latim, obiter (proparoxítona) significa em viagem, de passagem.

 

Iter quer dizer caminho. Dele nos veio itinerário – roteiro de uma viagem – e itinerante. Juiz itinerante é o que se desloca pelas comarcas. Usual, no Direito, é iter criminis: o percurso do crime. Iterar e reiterar se associam a ele. Guardam esta acepção: propor uma ação novamente, repetir.

 

Então, por que os dicionários de peso privilegiam as formas latinas campus/campi? Seguem o Volp, que insere campus no rol dos estrangeirismos. Não nos esqueçamos deste pormenor: eles datam de 2009.

 

Em sua próxima edição, o Dicionário da Academia – esperamos – haverá de ceder ao encanto de tantas palavras que, em situação igual, desfilam com figurino nosso. Agasalham foros de cidadania mais do que justos.

 

Matemos a curiosidade. Por que grafarmos campus e campi, se temos bônus, húmus, mórbus, múnus, nímbus, ônus, tônus, vírus? Observemos bem: sempre acentuadas. Mais: o plural é idêntico ao singular.

 

Já é tempo de listar campus nesse grupo. A Profa. Piacentini, em Não tropece na língua, assegura que muitas editoras já adotam a grafia câmpus – singular e plural. O Prof. Cegalla, em seu Dicionário de dificuldades, é categórico: Prefira-se a forma aportuguesada câmpus, com acento.

 

No vol. I do Guia prático de português correto, Cláudio Moreno pontua que câmpus é uma daquelas palavras mutantes que se encontram numa espécie de limbo entre o latim e o português. Isto é dele: Eu sempre aconselho o uso da forma evoluída câmpus.

 

Verdade da roça: Cigarras cantando, indício de tempo bom. Na Veja de 8-6-2016, p. 87, demos de cara com esta forma: Um em cada cinco estudantes universitários americanos já sofreu abuso ou tentativa de abuso sexual nas dependências dos câmpus. Maravilha!

 

A despeito da posição abraçada pelo Volp, julgo de bom-tom usarmos câmpus, seja no singular, seja no plural. Vamos vestir esta palavra do verde-amarelo, cores marcadamente brasileiras. Afinal, uma pitada de coerência não faz mal a ninguém. E bola pra frente!

 

Basta!


Cuiabá-MT, 27-4-2017.

 

Prof. Germano Aleixo Filho,

Assessor da Presidência do TJMT.