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Poder Judiciário de Mato Grosso

 
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09.04.2015 15:40

Moradores lotam ginásio para ouvir Maria da Penha
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Aplaudida de pé por mais de três mil pessoas. Assim Maria da Penha Maia Fernandes, 70 anos, foi recebida no Ginásio de Esportes “Arnaldo Martins”, no município de Barra do Garças (509km a leste de Cuiabá), no dia 7 de abril, onde ministrou uma palestra sobre violência doméstica, a partir da sua história de vida.
 
O evento marcou o encerramento das ações iniciadas em março (Mês da Mulher) com o objetivo de reduzir os índices de violência contra a mulher nos municípios de Barra do Garças e Pontal do Araguaia. A palestra foi organizada pela Rede de Enfrentamento da Violência Doméstica e Familiar, integrada por uma série de parceiros, incluindo a Comarca de Barra do Garças.
 
Assim que ela começou a falar, as 3.200 pessoas que estavam no ginásio se calaram. Por 40 minutos elas escutaram a história de luta da mulher que inspirou a lei contra violência doméstica no Brasil (Lei nº 11.340/2006, a Lei Maria da Penha).
 
A cearense de Fortaleza, formada em farmácia e com mestrado na área, sempre foi uma mulher instruída e batalhadora. Sua vida mudou radicalmente no dia 29 de maio de 1983, quando, dormindo, levou um tiro do ex-marido. Depois de quatro meses internada ela deixou o hospital em uma cadeira de rodas. O tiro na coluna a deixou paraplégica.
 
Depois de sofrer uma segunda tentativa de homicídio, ser mantida em cárcere privado, ela conseguir fugiu de casa com as três filhas pequenas. Escondida na casa de parentes, Maria da Penha começou a lutar para que seu agressor fosse condenado. Depois de esgotar todos os recursos internos (no país) e do crime quase prescrever, o Brasil foi denunciado para a Comissão Interamericana dos Direitos Humanos.
 
A Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou o país, que até então negligenciava os casos de violência doméstica. Esta discussão colocava o Brasil na berlinda, que, a partir daí, foi obrigado a mudar as leis. Em 2006, depois de muita luta, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a lei que leva o nome de Maria da Penha.
 
O caso só tomou repercussão internacional depois que Maria da Penha, em 1994, lançou um livro intitulado “Sobrevivi, posso contar”, onde narra com detalhes sua história de agressão, sofrimento e luta.
 
Vítimas se identificam - Enquanto Maria da Penha conta sua história, no meio da plateia a aposentada Mailde Neri, 86 anos, escuta de pé cada palavra. Seu sonho era conhecer pessoalmente Maria da Penha. “Minha história de vida é parecida com a dela, eu me identifico, porque já sofri muito nesta vida. Meu marido me batia muito, me amarrava, me xingava, me maltratava e eu agüentava calada”.
 
Mailde sofreu violência durante 15 anos. As agressões, do marido alcoólatra, eram frequentes. O medo de morrer, porém, impedia Mailde de fugir de casa, já que na época denunciar este tipo de agressão era algo quase impossível. “Não tinha a quem recorrer. Se mulher que apanhava do marido pedisse separação morria de fome, era mal vista. Tudo era muito difícil. Só parei de apanhar quando consegui fugir com minhas filhas”. Além de assistir à palestra, Mailde pôde conhecer Maria da Penha, lhe dar um abraço e dizer que hoje se sente uma guerreira.
 
As histórias de vida das mulheres que sofrem violência doméstica (física e psicológica) são semelhantes, não importa a região do país, a condição social e o nível de escolaridade. O que muda é a maneira que cada uma delas lida com a situação, já que ainda é grande o número de mulheres que não denuncia o agressor, mesmo com a lei.
 
A própria Maria da Penha destaca que apesar de a lei ser conhecida pelos brasileiros, ainda não existe uma conscientização generalizada por parte dos gestores públicos, já que muitos não têm interesse em criar políticas públicas para que a lei saia do papel e seja aplicada na prática.
 
“Uma pesquisa mostrou que 98% da população brasileira tem conhecimento da Lei Maria da Penha. Esse percentual pode não saber exatamente como a lei funciona, mas sabe que a lei veio para proteger a mulher vítima de violência. No início havia muita dúvida, como toda lei nova, para atender a verdadeira finalidade e fazer ela funcionar. Esta dificuldade hoje depende apenas do querer do gestor público. Se ele não tem interesse de fazer com que a lei seja aplicada, ele não respeita as mulheres do seu município, do seu estado. Ele é um machista, que precisa desconstruir isso dentro dele, para só depois poder ajudar aquelas mulheres que precisam do poder público”.
 
Rede de Enfrentamento – De acordo com o juiz que integra a Rede de Enfrentamento, Wagner Plaza Machado Junior, a proposta, ao trazer Maria da Penha para proferir palestra para falar sobre esta temática, foi de estimular as mulheres que sofrem algum tipo de violência doméstica - ou aqueles que presenciam cenas de agressão - a denunciarem.
 
“A presença dela é muito positiva, pois sua luta serve de exemplo para que outras mulheres possam se inspirar. O trabalho da Rede, que atualmente é composta por 20 entidades, tem funcionado e hoje nós já percebemos que o grau de conscientização tem aumentado. Algumas mudanças significativas já têm acontecido em Barra do Garças e isso nos deixa orgulhosos”.
 
Conforme ele, uma das mudanças que podem ser percebidas é com relação às denúncias, que hoje não são feitas apenas pelas vítimas, mas também por familiares, vizinhos, ou amigos que presenciam ou sabem de situações de violência envolvendo mulheres. “A informação está sendo disseminada”.
 
Outro dado positivo, segundo o magistrado, é com relação ao percentual de reincidência dos agressores. Atualmente em Barra do Garças dos 83 homens, entre aqueles que já cumpriram pena e os 28 que estão participando do grupo de apoio, apenas cinco voltaram a reincidir. “Um índice em torno de 6%, bem abaixo da média nacional, que para a violência doméstica é em torno de 10%”, destaca o juiz.
 

Fotos: Tony Ribeiro/Agência F5 
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